"Somos filhos das hostes imortais
Estamos além da sua vaga percepção"
Estamos além da sua vaga percepção"
Braia.
Às vezes, estar na vida é como estar na cadeira do oftalmologista para ler aquelas letrinhas: escolhe-se a melhor combinação de lentes para tornar a visão mais nítida. Essa ou a de antes? questiona o médico. Essa! Essa! A de antes, essa, a de ant...não sei se sou só eu, mas sempre acontece de confundir-se e não saber se a melhor é a atual ou a anterior! E se fica nítido demais também é estranho. Lembro que, logo que comecei a usar óculos, não me acomodei muito facilmente ao ver esse admirável mundo novo, c(h)egando até a rejeitar um pouco a idéia frente a essa limpidez, pois há muito havia me adaptado à visão turva...
E se, por acaso, for escolhida a lente "errada", mesmo que pela menor alteração na lente? Certamente, prejudicará a qualidade da imagem que é vista, mas nada irreversível. Tem-se total liberdade de trocar as lentes, quando quiser e pelo 'grau' que julgar melhor - ficar sem lente alguma também é uma opção válida.
Nada é realmente como enxergo, mudo as cores pra agradar meu ser...
O que busco dizer, na verdade, é que o mundo, no fim das contas, pode ser enxergado das mais diferentes formas, cores, tamanhos, texturas, sem que se tenha que assumir um juízo de valor do que é certo e o do que é errado. Lentes são escolhidas e divergem entre si do que podem ver - e principalmente do que não podem. A natureza pode ser descrita e demonstrada por fórmulas físicas, análises biológicas e experimentos químicos, ou pode ser, simplesmente, apreciada como a divindade propriamente dita ou fruto do amor divino, dádiva dada por um ser maior, Deus - o que o primeiro viés também não exclui (Universo?). O ser humano pode ser estudado por meio daquilo que faz, que é demonstrável e mensurável ou pela sua essência, seus medos e seus simbolismos, ou seja, pelo seu mundo externo ou pelo seu mundo interno, fundamentando-se na dicotomia comportamento vs. mente. Por fim, assume-se um foco na imagem, mas o que há no fundo - desfocado - não pode ser negligenciado, tendo em vista que nada é capaz de abarcar todas as explicações...
De certa forma, então, ao se olhar para o que nos circunda, estaremos sob influência da lente que assumimos para nós mesmos. A vida pode ser vista pela felicidade plena, verdadeira ou na alienação pela química, sendo essa o excesso de dopamina que nos dão essas sensações de felicidade e faz essa sociedade maníaca, onde todos tem de ser feliz o tempo todo; ou na melancolia, recanto de inspiração dos poetas, onde os sofrimentos são minuciosamente sentidos, sentidos tanto que viram palavras. A visão deturpada da felicidade e a atenção carinhosa à tristeza. Inversão, transgressão, foco no problema ou foco na solução...
Mas, como já dito, isso não é estático e se pode trocar quando lhe for conveniente, ainda que persista a ilusão de que aquela imagem é a verdade. Até pode ser naquele momento, mas há outras verdades. Como em um microscópio de ilusão, as ilusões adquirem proporções bem maiores do que realmente são e enganar-se - conscientemente ou não - faz parte...
O que tens em teu foco agora? O primeiro plano? O seco, morto, talhado, estável. Ou o segundo plano? O vívido, dinâmico, corrente, mutável. Se não está vendo alguma coisa, está na hora de consultar o seu oftalmologista pra mudar as lentes...
Pois enganar-se é uma opção desde que sejam conhecidas as outras opções.
PS,: "Quando os americanos iniciaram o lançamento de astronautas, se depararam com o seguinte problema: as canetas não funcionavam em gravidade próxima de zero. Para resolver esse enorme problema, contrataram a empresa de consultoria Andersen Consulting, hoje Accenture. Empregaram 12 milhões de dólares para sanar o problema. Conseguiram desenvolver uma caneta que escreve em gravidade zero, de ponta cabeça, debaixo d’água, praticamente em qualquer superfície, incluindo cristal, e em temperaturas desde 30ºC abaixo de zero até 300ºC. Os russos usaram... lápis."
Do livro: Lições de Vida
Paulo Mundin Prazeres
Edicta/Soleto
Paulo Mundin Prazeres
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